«(...)Desde a
primeira linha de texto, desde a primeira palavra, Isabela Figueiredo coloca-se
do lado dos excluídos, dos marginalizados, dos esquecidos. Dá-lhes voz, dá-lhes
presença e inscreve-os no tecido da realidade suburbana do nosso tempo (a ação
decorre entre o fim de 2018 e o Natal de 2019). (…)
O narrador
principal é José Viriato, um homem de 54 anos que anda ao lixo na Margem Sul do
Tejo. É um recoletor que dá a volta aos contentores de madrugada, recolhendo o
que os outros abandonam, por vezes ainda em perfeito estado. A esses “despojos”
do consumo excessivo, recupera-os, ressuscita-os, vendendo-os depois por bom
preço na Feira da Ladra. Os trocos juntam-se ao rendimento social de inserção e
ao dinheiro que a avó nonagenária lhe vai enviando — tudo somado coisa pouca,
mas o suficiente para sobreviver com autodisciplina e frugalidade. A vantagem é
ficar liberto da escravatura do trabalho, ser livre de só fazer o que lhe
apetece, quando lhe apetece: sair para as suas rondas durante a noite; dormir
enrodilhado com os seus dois cães durante o dia. Ao deambular pelas ruas, no
avesso da azáfama dos outros, ele tem olho para as “miudezas” em que pouca
gente atenta. No fundo, é um flâneur que sabe contemplar: “Vejo beleza em tudo.
No banal, no rude e no grosseiro. Há beleza aos nossos pés. Há um pedaço de
plástico amarelo roído que parece uma margarida. Nos dois milímetros que
separam as pedras da calçada nascem ervas após a chuva. Pousa sobre os meus
sapatos uma folha de árvore raiada de vermelho-sangue.” (...)».
Há aqui uma dimensão do Desenvolvimento Sustentável, via Economia Circular, a que não se resistiu. E da componente «social», associada à «economia» e ao «ambiente», iniciais, a que se acrescenta a «governação» e «cultura» na formulação que defendemos para SUSTENTABILIDADE (ou Desenvolvimento Sustentável, ou Verde, que lhe são «sinónimos») e que muitos já praticam. E talvez também se veja aproximação ao «futuro do trabalho». Força da literatura, força da ficção. Mas é claro que a obra visa além.
Resumo
Este novo romance de Isabela Figueiredo, a que ela deu o sugestivo e justificado título de Um Cão no Meio do Caminho, conta-nos as histórias de um homem e de uma mulher que sofrem, cada um à sua maneira, um dos grandes males da vida moderna – a solidão. Neles a solidão é a resposta aos violentos acidentes com que a vida os agrediu.
As sociedades modernas vivem sobre a violência. Mas há quem a recuse, como é aqui o caso de José Viriato e da sua misteriosa vizinha, Beatriz, que todos conhecem como a Matadora. O acaso junta-os, como o leitor verificará com a leitura deste livro. Que resultado obtemos quando se juntam duas solidões?
É esta a questão que este novo romance da autora do aclamado A Gorda vem equacionar, deixando a resposta ao critério de cada leitor. Eventualmente um cão pode ajudar.
Bom, se segue as «estrelas» dos criticos, José Mário Silva dá-lhe quatro. O titulo do seu texto: A beleza no meio do lixo. Com a seguinte entrada:«Isabela Figueiredo regressa, depois de “A Gorda”, com um romance poderoso sobre a “fruta feia” que raramente tem voz na literatura portuguesa».
Sem comentários:
Enviar um comentário